sábado, 2 de agosto de 2008



"O vovô Vicenzo era tão divertido quanto o vovô Javier, mas em outro estilo. Uma vez me contou como se salvou de um naufrágio famoso. Perguntei se ele tinha se safado porque sabia nadar. 'Não, mas que idéia. Sempre tive mais afinidade com as aves do que com os peixes. Mas a verdade é que também não sei voar.' Sua gargalhada florentina ressoava no pátio como um carrilhão. 'E então como foi que você se salvou?' 'Muito simples: perdi o barco em Gênova. Cheguei ao porto meia hora depois daquela partida asquerosamente pontual. Tentei arranjar uma lancha para me levar até o navio (ainda estava à vista). Por sorte fracassei no propósito. Quando soube, dez dias depois, que o buque afundara em pleno oceano, não me veio uma idéia menos egoísta do que festejar com um garrafão de Chianti. Já sei que está errado, que eu devia ter pensado nos outros; hoje não faria isso de novo, mas naquela época eu era muito jovem e ainda não aprendera a ser hipócrita.' E aqui outra gargalhada."


BENEDETTI, Mario. A borra do café. Rio de Janeiro: Record, 1998. p. 19-20.

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